- Área: 790 m²
- Ano: 2023
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Fotografias:Federico Cairoli
Descrição enviada pela equipe de projeto. A Praça do Mercado integra o conjunto de arquiteturas do Parque Realengo, ainda em construção. O Parque é objeto de questionamento de longa data de diversos movimentos sociais que debatem a periferia, áreas verdes e racismo ambiental. À semelhança de diversos processos de construção na cidade do Rio de Janeiro, sua dinâmica também envolve desapropriações e processos de realocação. A Praça do Mercado nasce de uma condição preexistente. Antes de seu desenho, moradores do entorno do parque ocupavam a esquina com pequenas construções de caráter comercial. O projeto de arquitetura proposto previu a realocação integral dessas construções, porém a dinâmica complexa de um processo de licitação e execução de uma obra pública fez com que se realizasse apenas parte da proposta.
O projeto é constituído por duas construções lineares e horizontais, com diferentes alturas, que se cruzam e conformam, por um lado, uma grande cobertura de entrada e, por outro, uma galeria de lojas. Antes, as lojas que constituíam a ocupação preenchiam o contorno da esquina, deixando apenas uma calçada estreita e uma via para carros em sua frente. Agora, elas se abrem para um espaço de praça que se comunica com o hall de entrada da comunidade do Ideal e o ponto de mototáxi. Implantados em formato de L, compõem uma grande praça pública que convida os moradores a vivenciarem o espaço, utilizando-o de formas diversas.
O caráter formal que diferencia as duas construções também se traduz em caráter programático. A cobertura linear tem a função principal de proporcionar sombra e marcar uma espécie de pórtico, que funciona como uma das entradas do parque. Por ser um grande vão de pouco direcionamento programático, esse espaço pode ser lido como indeterminado, abrindo possibilidade para ocupação com programas diversos e efêmeros. A segunda lâmina, em contraponto, é construída com uma escala mais próxima do corpo. Nela foram abrigadas 11 lojas que servem para realocar as lojas pré-existentes. O comércio local, além de ser de suma importância para a dinâmica de existência de diversos moradores, aqui também impulsiona a utilização desse espaço público e, mais ainda, com um programa que já existia antes de seu reordenamento. Abaixo da lâmina maior, há ainda um banheiro público que dá suporte tanto às lojas quanto ao uso do espaço. E, por fim, organizando todos esses programas, uma praça pública foi desenhada para fora dos limites do parque, possibilitando o uso e apropriação do espaço em tempo integral.
A estrutura da cobertura de acesso segue um sistema construtivo com perfis metálicos de 3 metros de comprimento, que, quando articulados, formam duas treliças de 66 metros de comprimento e 3 metros de altura. Essas treliças são conectadas por perfis metálicos de 9 metros de comprimento, conformando assim uma caixa estrutural. Essa altura e sistema de vigamentos são justificados pela melhor eficiência estrutural, garantindo o vencimento de vãos maiores com menos apoio, além de possibilitar o uso de perfis mais esbeltos. Nas extremidades, essa caixa estrutural está apoiada em pilares de concreto de seção quadrada e rotacionados, a fim de incentivar a continuidade do fluxo. Já a galeria de lojas é construída por paredes de blocos de concreto estruturais que sustentam uma laje de steel frame.
Pode-se considerar que a inauguração antecipada do Mercado Externo teve o intuito de responder às reivindicações contra um processo de remoção que ocorreria das lojas existentes, processo esse que conta com a participação da equipe de projeto para proporcionar, dentro do desenho, áreas passíveis de realocação. E, para além disso, é prioritariamente um processo de acompanhamento e advocacy territorial, mobilizado pela Agenda Realengo 2030, dirigido por Roberta Freire.
Pensar a construção de um equipamento público é também pensar sobre a queda de uma postura da produção arquitetônica como necessariamente um êxito. Mesmo que a construção deste parque vá ao encontro da vontade dos movimentos sociais, é preciso entender o processo de implementação de arquiteturas urbanas como um processo social que vai além do desenho. Para isso, entendemos que há a necessidade de considerar as dinâmicas de construção da cidade coletivamente, não como ocupações póstumas à entrega do produto construído em espaços indeterminados, mas como constitutivas e partícipes do processo de projeto. A Praça do Mercado torna-se desta forma um importante objeto para pensar esse debate.